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domingo, 18 de fevereiro de 2018

Resenha: O Escravo de Capela - Marcos DeBrito


Sinopse: Durante a cruel época escravocrata do Brasil Colônia, histórias aterrorizantes baseadas em crenças africanas e portuguesas deram origem a algumas das lendas mais populares de nosso folclore.Com o passar dos séculos, o horror de mitos assustadores foi sendo substituído por versões mais brandas. Em “O Escravo de Capela”, uma de nossas fábulas foi recriada desde a origem. Partindo de registros históricos para reconstruir sua mitologia de forma adulta, o autor criou uma narrativa tenebrosa de vingança com elementos mais reais e perversos. Aqui, o capuz avermelhado, sua marca mais conhecida, é deixado de lado para que o rosto de um escravo-cadáver seja encoberto pelo sudário ensanguentado de sua morte. Uma obra para reencontrar o medo perdido da lenda original e ver ressurgir um mito nacional de forma mais assustadora, em uma trama mórbida repleta de surpresas e reviravoltas.



Título: O Escravo de Capela (Skoob)
Gênero: Terror
Editora: Faro Editorial
Páginas: 288
Onde comprar: Amazon / Submarino
Classificação: 10 (Excelente!)
Livro cedido pela editora.



A história se passa no Brasil colônia, em 1792, na lavoura de cana-de-açúcar da Fazenda Capela. Antônio Batista de Cunha Vasconcelos Segundo é o capataz responsável pelo trabalho dos escravos na lavoura, primogênito de Antonio Batista, senhor da fazenda. Suas ações são caracterizadas pela falta de controle e severidade nos castigos aplicados sobre os escravos.

“Tendo as costas do escravo como tela, o feitor pincelava de vermelho o seu escárnio. Naquela aquarela abstrata de sangue e suor, a dor encontrava bem o seu contorno.” (p. 13)

Sabola Citiwala foi levado recentemente para a fazenda, contudo, não aceita ser escravo e se mostra incapaz de acostumar-se com a vida da lavoura. Conhece o velho Akili na senzala, um escravo que tentara fugir há alguns anos, mas seu fracasso resultou em um castigo brutal que o tornou incapaz de andar. Unidos pelo mesmo ideal de liberdade, criam um plano para que Sabola consiga escapar.

“Todos os negros encontravam adormecidos; restava apenas aguardar que a coragem de Sabola acordasse. Mas tempo não era um luxo que ele poderia desperdiçar com covardia. Era alta madrugada e em poucas horas o sol surgiria para denunciar os seus passos. Assim, determinou que estava pronto.” (p. 85)

Tanto o senhor da fazenda quanto seu primogênito revelam extrema violência e sadismo ao lidar com os escravos, sendo Antonio famoso por seus castigos fatais. Inácio, o filho mais novo de Batista, é o único que se preocupa com o bem estar dos trabalhadores.

Após deixar a fazenda para estudar medicina na Europa, ele retorna por um breve período, não aprovando o tratamento desumano que vem sendo aplicado por sua família.

O livro aborda a realidade cruel e abusiva do trabalho escravo e o desejo por vingança, mesclando nuances do sobrenatural com o terror causado pelas mãos do próprio homem.

O Escravo de Capela trata-se de uma releitura da lenda folclórica do Saci-pererê, porém, há um personagem bem diferente do Saci normalmente descrito nas histórias infantis - caracterizado principalmente por ser brincalhão e fazer traquinagens como dar nó nas crinas dos cavalos. Na obra, o Saci-pererê assume um aspecto cruel e assassino, vingando-se dos senhores da fazenda. A ave martim-pererê também é citada, tendo o assovio característico do Saci copiado da típica ave.

Confesso que, como boa fã de terror, preferi a versão do Saci-pererê de Marcos Debrito à original, rs. Com sua aparência cadavérica e o capuz vermelho com o qual foi sufocado ainda cobrindo o rosto, o personagem traz suspense e terror à obra, causando aquela sensação desconfortável enquanto, ao mesmo tempo em que lemos, conseguimos ouvir o assovio do Saci e contemplar a névoa que acompanha seus passos.

A narrativa é muito envolvente e repleta de ação e suspense, fluindo muito bem. A linguagem utilizada é da época, mostrando alguns costumes ao longo da trama, tanto dos senhores da fazenda quanto da rotina da escravidão e a forma como os negros eram levados para a fazenda e tratados de forma desumana. As tradições africana também aparece, principalmente nos atos de Akili. O cenário concentra-se na Fazenda Capela, porém, é bem descrito e detalhado, permitindo visualizar o local e entrar no clima da narrativa.

A capa é bem bonita, as páginas vermelhas dão o toque especial, enfatizando ainda mais a dor contida na obra. Vale ressaltar que a revisão e a diagramação estão impecáveis.



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